3/14/2009

LISBOA, Auto da Feira da Ladra




Iº Andamento


Feira da Ladra cercada
pela Cruz e pela espada!
Como batina fardada
fosse em teu redor cardada.
Passo o arco do Mosteiro
sede do Patriarcado,
continuo e logo ao lado…
vejo o primeiro tendeiro!

- “Boas botas e a bom preço.”
O casaco… Ei! Enlouqueço!?
Outras voltas são as minhas
e os cabedais acumulados
são pra gastos encurtados:
cá se cosem outras linhas!
E lá me forro de forreta:
- “São bonitas, estou sem cheta.”

E prossigo adiante,
para junto do mirante,
pois existe lá jardim
com uma vista pro Barreiro,
abarcando o Tejo inteiro
E deslumbrando até ao fim…


IIº Andamento

- “Não me arranjas um cigarrinho?”
Assim metia conversa
“O Barão de Bratislava!”
E crendo que ia pilhar
um franguinho pra manjar…
Todo ele se babava:
“O Barão de Bratislava!”

- “Tenho cordas e roldanas,
muito lastro pra vender,
pra te içar e assim prender
a rapariga que amas.”
~
- “Mas que dizes oh farsante,
para aqui chegam boatos?”
Como sabia meus tratos,
O finório do feirante?

- “Tenho uma beje carrinha
onde pára toda a tropa…
Não suspeitas? Mas quem topa,
quem se lembra de ir à coca…
ao Hospital da Marinha!
Está por lá o material
para o teu sonho irreal.”

Procurava p’lo tabaco,
demorei-me só um naco!
Quando olhei já lá não estava:
“O Barão de Bratislava!”

Saí dali assustado!
“Ena, bolas! Como tremo…
Eu teria visto o demo?”
Ao voltar para o mercado,
demandei ao mestre Gil
do liceu tão altaneiro:
“Devo crer por verdadeiro
ou por encenado ardil?”

Resoluto? Fui descendo
para o local aprazado
com cautelas de escaldado,
de quem algo ia temendo…
Pois passei o Panteão
das obras de Santa Engrácia…
ia então eu na falácia,
nas falinhas, do Barão?
Eis senão que o mafarrico
“O Barão de Bratislava!”
à palavra não faltava.

- “Lá chegaste oh manjerico!
Tenho aqui o teu engodo.
Passa, vá! Esse teu ouro,
ou na costa virá mouro!
Já por ali vai um normando,
como cão está farejando…”

- “E olvidas alemães?
Mas juízo já não tens?
Se esta terra é dos que vivem
da labuta e do jornal
nesta ponta Ocidental
que chamamos Portugal!”

- “Ai que anjinho cai da nuvem!
Chiu! Cuidado, ele faz ronda!
Demos cana? Não deu onda…
Vá, não tenho o dia inteiro,
quero ver esse dinheiro!”

- “Mostra tu primeiro a cena!
Quero saber se é real,
se gabado material
valerá de facto a pena…”

E então… Para espanto meu,
Foi atrás e abriu a mala…
Contrabando que estalava!
Cumprira o que prometeu,
“O Barão de Bratislava!”

-“Mas o preço é um tanto caro…”
- “Logo vi que tinhas faro.”
…Disse o esperto do Barão!
“O Barão de Bratislava!”
Não foi fácil convencê-lo,
a baixá-lo, a descê-lo,
para um preço mais à mão!

Mas por fim armadilhado,
fui saindo acelerado…
E gritei possesso ao vento:
“Oh Inês, tu já verás,
o meu amor neste cartaz!”

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