6/10/2010

Vos estis Lux mundi!

Agostinho da Silva dizia amiúde que “os portugueses foram feitos para o impossível”. Deixemos, portanto, o possível para os alemães! Portugal, pequeno país despojado de recursos, na finis terrae da Europa, estruturalmente atrasado, em face duma terrível crise económica, incapaz de convergir com os padrões europeus, há muito que esgotou o papel de “bom aluno” que muitos lhe auguraram no processo de integração: nem “Florida”, nem “Califórnia” seremos da União, senão a “Louisiana” – um dos Estados necessariamente mais pobres e sujeito ao maior dos abandonos.


É inútil inquirir se o capitalismo é incompatível com o “modo de ser português” ou se simplesmente chegámos, enleados nas nossas fantasias, demasiado atrasados ao comboio da história. Basta-nos compreender que, nesta ordem natural das coisas do mundo, Portugal mais não pode ser que um Estado-nação inviável, tutelado e dirigido pelo exterior (da EU provém já a maioria da nossa legislação, por ex.), sem outra quimera senão a da subserviência mimética e esmolada correndo atrás da sombra do destino. Crise de identidade? Crise cultural? Crise de poder? Crise tout court!


Mas no momento próprio em que o sistema, literalmente, chega aos seus limites, porque insistiremos em prosseguir para diante, em direcção à catástrofe ambiental, à delapidação dos recursos, à incessante e desumanizada busca do lucro e da “produtividade”, que deixa povos, continentes inteiros para trás?


Ao diabo, portanto, com os “processos de gestão”, os balancetes, os critérios pós-fordistas e os códigos empresariais! Não fomos nós seres humanos criados e destinado para isso e manifestamente não está a resultar para a grande maioria de nós... Uma nova forma de organização social baseada na cooperação e não na concorrência, no comunitarismo e não na posse privada será chamada a ser construída. Se os portugueses, que através da sua expansão ultramarina criaram as condições materiais para o capitalismo moderno, poderão agora descobrir o caminho para as novas “Índias”?


Os mitos mais fortes se tornam em épocas de crise, angústia e incertezas... Ora nós temos, na nossa cultura, os mitos necessários para mapear as nossas descobertas futuras: a Saudade e o sbastianismo. Mitos como prolongamento das “fantasias lusitanas”? Talvez... mas como Jean Cocteau certa vez afirmou: “sempre preferi o mito à história. A história é feita de verdades que se transformam em mentiras, a mitologia em mentiras que se transformam em verdades”...


Indubitável é que da última vez que se propuseram reinventar a (sua) história e identidade, a 25 de Abril de 1974, os portugueses concentraram, pela vez única na sua contemporaneidade, as atenções e esperanças do mundo. Talvez na próxima aurora, livres de estereótipos, alheios à geopolítica e ao “realismo”sejam capazes de cruzar o mar sem fim e cumprir-se, mostrando aos povos do mundo os caminhos para a sua emancipação, inaugurando o Quinto e último Império capaz de irmanar a humanidade na concórdia, na paz e na felicidade através duma espiritualidade renovada.


Mas se poucos sabem ler o que está escrito nas trovas de Bandarra... Restam-nos as palavras de Pessoa/Álvaro de Campos: “Eu, da Raça dos Descobridores, desprezo o que seja menos que descobrir um Novo mundo!”

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