4/06/2010

Marionetas do Horóscopo 20


Sujo, com louça por lavar e discos pelo chão, cocei a barba de muitos dias pensando que eles poderiam até - e afinal - ter alguma razão. Para que acalmasse os nervos, o horóscopo prescrevia-me às colheradas, convenientes conselhos sobre os poderes curativos de “contactar com o mar”, da “felicidade do celibato” – realmente ter sido corneado e abandonado pela minha mulher fora um dádiva dos céus… - e da necessidade de ter “consciência dos problemas religiosos”. A receita sabia a ranço e só podia ser entendida como um convite implícito para prosseguir explicitamente no trilho do esoterismo astrológico, ajudando o Sr. Hadès e os seus amigos a enriquecerem. Que grande banhada!


Mas para que não houvesse senão sem bela, douravam-me a pílula, afirmando o horóscopo, sobre a estrada do Ascendente Peixes, que possuía uma “sensibilidade muito forte”, tornando-me numa espécie de “Virgem emocional”… Mas qual era a aplicação prática, o ganho concreto, palpável e aproveitável de ter sentimentos? Que benefício adquiria? No fundo, no fundo, só ganhava um aparente contra-senso entre termos: Virgem e sentimentos… e na verdade, era-o mesmo! Assim mo afiançou, mais tarde, certa astróloga italiana que, na primeira vista de olhos ao meu Mapa Astral asseverou que tinha “tudo no sítio” para se despedir de mim, num último relance, com o veredicto final de ser “um poço de contradições”.


Segundas opiniões apenas confirmariam o diagnóstico, carregando-o - se tal fosse possível e assim se revelou – com as mais sombrias cores. Eu, porém, estava dando os primeiros passos em direcção ao auto-conhecimento e, na minha verde inocência, guardava a expectativa de descobrir em mim uma mão-cheia de virtudes, recuperando o amor-próprio e um senso de auto-estima. Prossegui, portanto!

2 comentários:

Anónimo disse...

Gosto muito do que escreves.

Pedro disse...

obrigado, mas eu gostava de gostar tanto como gostarás tu... Sem ponta de ironia!